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Seguro de Crédito necessita de confiança

A crise econômica deflagrada em setembro de 2008 impôs uma série de discussões ao mercado financeiro – os caminhos e descaminhos do capital ao longo das décadas e os rumos a se seguir a partir de então. Mas o que passou de forma acrítica pela indústria foi o papel desempenhado pelas Seguradoras de Crédito nesse período de instabilidade. Muitas empresas que detinham apólice de seguro de crédito tiveram as coberturas modificadas pelas seguradoras quando mais precisaram.

A apólice de seguro de crédito permite que uma empresa se proteja do risco de inadimplência financeira nas vendas a prazo de mercadorias/ prestação de serviços. A apólice abrange todas as vendas a prazo – princípio da globalidade-, mas a seguradora estabelece um limite para cada comprador -princípio da individualidade. No caso de um litígio comercial, a cobertura fica suspensa até o caso ser resolvido em favor do segurado.

Ao contrário de quase todos os outros tipos de seguro, a seguradora tem o direto, durante a vigência da apólice, de alterar riscos, e excluir um ou vários compradores da apólice. No caso de uma apólice de seguro de crédito à exportação, a seguradora até tem o direito de excluir todas as empresas de um certo país da cobertura se ela se sentir desconfortável com o risco deste país.Contratualmente, a seguradora não tem a obrigação de justificar sua decisão.

O argumento da seguradora é que ela quer proteger o segurado de perdas potenciais. Um gerente de crédito de uma empresa, no final, tomaria uma medida similar referente a um comprador, no momento em que ele ficasse sabendo de uma situação financeira crítica, até porque a inadimplência deste comprador tem uma probabilidade alta. No Brasil, a grande maioria das empresas verificam se os compradores foram protestados recentemente e, em caso positivo, reajustam a própria política de crédito referente a este cliente.

O conceito de seguro de crédito vive da confiança de que as seguradoras do setor sempre farão o maior esforço para outorgar limites no valor mais alto possível, visando o melhor aproveitamento da cobertura pelo segurado. A atual crise econômica, aparentemente, coloca esta confiabilidade em dúvida. A grande maioria dos segurados reclamou que, desde outubro de 2008, muitos limites de crédito foram reduzidos ou até cancelados. Entrementes, seria errado dizer que as seguradoras de maneira geral cortaram os limites de forma linear, isto é cortando todos os limites da mesma maneira; pelo contrário, elas, em grande parte, estudaram limite por limite.

No final, o que tinha acontecido?
Até Agosto de 2008 e durante um período muito longo, as principais economias no mundo só cresceram. Nesse cenário positivo, as seguradoras tinham dado limites de crédito com certa facilidade, especialmente nos limites menores, aprovando limites de crédito, em parte, baseados na própria experiência estatística (setor/ramo, país, anos de atuação no mercado) e não necessariamente em informações financeiras auditadas. Agir dessa forma até é uma necessidade,pelo fato de que muitas empresas de pequeno e médio porte, no Brasil e em muitos países, não têm um balanço auditado ou, se tiverem, não o colocam à disposição de terceiros. Agora, com umas inistralidade crescente, as seguradoras de crédito foram obrigadas a aplicar regras de aprovação mais rígidas, ou seja, sem dados financeiros recentes, nenhuma empresa pode ser avaliada e, conseqüentemente, não receberá um limite de crédito.
No auge da crise, a relação comercial que talvez já tenha durado muitos anos perdeu importância:só hard facts são considerados. As seguradoras de crédito até informaram aos seus segurados sobre este dilema e deram prazos para que estes apresentassem dados financeiros recentes de seus compradores. Infelizmente, nem todos os compradores entenderam esta necessidade do mercado.Assim, o desafio que o ramo de seguro de crédito enfrenta hoje é a falta de transparência.

Por outro lado, também é uma verdade que as seguradoras, quase sempre, com ou sem crise, agem com uma cautela maior do que os segurados, que sempre sentem a necessidade de realizar uma venda, mesmo que com um risco elevado, para não perderem espaço no mercado.

A reprimenda que as seguradoras tem que ouvir é que elas não estavam dispostas aalterar/equilibrar as apólices de seguro de crédito com a entrada da crise. Foram comercializadas,por exemplo, apólices de seguro de crédito, no primeiro semestre de 2008, com as quais asempresas procuravam segurar um volume grande de vendas para a Argentina. O prêmio mínimo também foi ajustado com base nessas vendas. Com a crise, as seguradoras tiraram quase integralmente as coberturas dos clientes situados na Argentina. Assim, a base de cálculo destas apólices foi alterada e/ou até tirada. Em uma relação entre parceiros, seria de se esperar que a seguradora oferecesse uma alteração nas condições da apólice, ainda durante a vigência, a fim de reequilibrar os direitos e deveres novamente. Em muitos casos, esse ajuste teria significado um prêmio mínimo menor.

Infelizmente, as seguradoras perderam esta chance. As negociações de renovação agora vão mostrar com quais condições as empresas se sentem confortáveis em contratar apólices de seguro de crédito, bem como se o mercado vai crescer como nos últimos anos.

Provavelmente, as seguradoras de crédito serão obrigadas a adaptar alguns paradigmas do produto para fazer novamente bons negócios, que sirvam igualmente tanto para o segurado quanto para a seguradora.

Fonte: Revista Apólice 
Notícia publicada originalmente em 22.02.2010