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COMPETITIVIDADE É PREJUDICADA POR CRÉDITO LIMITADO

Enquanto a maioria dos países conta com os bancos de comércio exterior – os Eximbanks – e agências de crédito, o Brasil dispõe basicamente do Proex, sustentado pelos escassos recursos do Tesouro, e do Seguro de Crédito à Exportação (SCE), coberto pelo Fundo Garantidor das Exportações (FGE), do Ministério da Fazenda, até agora mais utilizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Somados os dois instrumentos, os desembolsos anuais de apoio à exportação de serviços estão estacionados ao redor de US$ 1,4 bilhão nos últimos três anos.

O quadro começa a mudar. Neste ano, pela primeira vez um banco privado, o Deutsche Bank, usou o FGE para financiar a exportação brasileira de serviços para Gana. Foram duas operações, informa a head de estruturação de exportação e financiamento do Deutsche, Florence Shoshany, que somaram US$ 253 milhões e envolveram não apenas serviços de engenharia, mas também bens e equipamentos. Como contou o presidente da Associação Brasileira dos Exportadores (AEB), José Augusto de Castro, “quando uma construtora brasileira faz uma obra no exterior, até o capacete usado pelos operários é exportado pelo Brasil”.

Uma das operações, no valor total de US$ 170 milhões com US$ 125 milhões em exportações brasileiras, é o projeto de Kumasi, considerado o maior mercado aberto da África Ocidental, onde circulam 600 mil pessoas diariamente, que carece de infraestrutura adequada e será reformado pela Contracta, uma construtora brasileira de médio porte. A outra operação, com valor total também de US$ 170 milhões e US$ 128 milhões em exportações brasileiras, é a construção do viaduto de Kasoa.

Florence trabalha na área do Deutsche Bank que avalia operações de comércio exterior com apoio de agências governamentais em 60 países. O primeiro negócio no Brasil saiu finalmente em março, depois de 12 meses de trabalho; já a segunda operação foi fechada pouco depois, após seis meses. Outras quatro estão em gestação.

As operações montadas por Florence usaram tanto o apoio do seguro do FGE quando a linha de equalização de taxas do Proex, que reduz a diferença de custo entre a linha de crédito local e a internacional. Ela acredita que, com o caminho das pedras delineado, será possível fechar os financiamentos em quatro a seis meses, prazo plenamente compatível com a de agências de outros países, bastante ativas no financiamento à exportação de serviços por parte de suas empresas. Sua experiência já anima outros bancos estrangeiros, contou.

O FGE também está otimista com o aumento da demanda e disposto a flexibilizar o que for possível para atender o mercado, afirmou seu administrador, Marcelo Franco, presidente da Agência Brasileira Garantidora de Fundos (ABGF). O fundo cobre risco comercial em operações acima de dois anos e risco político qualquer que seja o prazo. No fim de abril, seu patrimônio era equivalente a US$ 7,2 bilhões; e sua exposição a US$ 28,8 bilhões, dos quais 60% direcionados para serviços.

Até agora, o FGE foi utilizado basicamente pelo BNDES em sua linha BNDES Exim pós-embarque. De 2007 a 2014, o BNDEX-Exim financiou US$ 11,9 bilhões em exportações brasileiras de serviços de construção civil para a África e América Latina, com destaque para Angola (US$ 3,4 bilhões), Venezuela (US$ 2,3 bilhões) e até Cuba (US$ 846,9 milhões). São financiamentos com recursos do FAT cambial, cobertura do SCE e custo pela taxa interbancária de Londres (Libor).
Maioria dos países conta com os bancos de comércio exterior, os Eximbanks, e agências de crédito

A superintendente da área de comércio exterior do BNDES, Luciene Machado, afirmou que a exportação de serviços, notadamente de construção, requer a presença internacional das empresas que, uma vez vencedoras das licitações, acabam irrigando uma ampla cadeia de fornecedores no Brasil, preservando postos de trabalho. Mas o BNDES-Exim pós-embarque também pode apoiar a exportação de serviços de tecnologia da informação, como softwares, e a produção audiovisual.

Pesquisa feita pelo BNDES constatou que os financiamentos a construtoras feitos de 2010 a 2013 beneficiaram 3,5 mil fornecedores, dos quais 2,6 mil são pequenos e médios. Segundo a AEB, a exportação de serviços de engenharia ativa uma cadeia produtiva que envolve 1,2 milhão de empregos diretos

O consultor Welber Barral, da Barral M. Jorge, ex-secretário de comércio exterior, afirmou que o Brasil possui um déficit estrutural na balança de serviços, correspondente a 37,2% do déficit em conta corrente, e que esse mercado é altamente competitivo.

São esses dois bons motivos, destacou, para o governo dar mais importância ao apoio financeiro às exportações do setor. “Ninguém compra projeto de engenharia sem financiamento” concorda Castro, da AEB, que ainda critica o regime de caixa aplicado à contabilização do Proex e sua dependência dos acidentes de percurso do orçamento, o que esgota os recursos disponíveis rapidamente.

O orçamento separou para o Proex neste ano US$ 1,5 bilhão, que acabaram em maio. Já se discute um reforço, mas Castro defende como mais eficiente um mecanismo rotativo.

A exportação de serviços pode ser financiada pelo Proex no caso de empresas com faturamento anual bruto de até R$ 600 milhões e, mais comumente, pela linha de equalização. O Banco do Brasil é o repassador do Proex e o agente do Proex Equalização, ao qual outros bancos podem recorrer. De 2007 a 2014, o Proex financiou US$ 3,2 bilhões em exportações não só de serviços, e o Proex Equalização, US$ 1,7 bilhão.

Fonte: Valor Econômico | Maria Christina Carvalho | Para o Valor, de São Paulo | 17.6.2015